Em busca dos games indie

A oitava geração de consoles chegou em 2011, com destaque para o PlayStation 4 e o Xbox One – produtos da Sony e Microsoft, respectivamente. O avanço tecnológico elevou o nível técnico dos games, o custo de produção e, consequentemente, os preços para o consumidor final. 

oitava geração de consoles.

Apesar desta notória evolução, a parte criativa deixa a desejar, o que gera games parecidos entre si e contribui para uma indústria engessada. A repetição de recursos e jogabilidade que as produtoras utilizam também é uma característica marcante dessa geração. 

Em busca de alternativas que possam injetar novas possibilidades, estéticas e estilos, surgem os games indie. Jogos independentes que buscam dar ao jogador uma experiência diferente dos produzidos por grandes empresas. As desenvolvedoras de games indie trabalham com orçamento reduzido e equipe mínima. Os programadores fazem parte de todo processo de produção, desde o roteiro e parte criativa até a parte visual e trilha sonora.

Renato Santiago, de 22 anos, joga videogame desde pequeno e sempre foi muito fã da saga Kingdom Heart e dos games Star Wars. Ao procurar novas narrativas e experiências, passou a se dedicar mais aos jogos indies nos últimos anos.

Hoje em dia, Renato passa mais tempo jogando games independentes do que as grandes franquias mundiais: “Às vezes eu me canso de olhar os lançamentos AAA e notar que eles costumam estar sempre nos mesmos moldes, ver um shooter de alguma franquia se manter igual aos anteriores e seus concorrentes também não apresentarem mudanças tão significativas”.

Expandir o vocabulário em outras línguas, ser apresentado a novas ideias narrativas, artísticas e de jogabilidade é essencial para o jogador. “Eu costumo jogar um jogo novo pelo menos uma vez por dia, variando entre 1 a 4 horas de gameplay”.

O amor foi tanto que Renato se formou em design de games em 2017 e optou pelo desenvolvimento de produções independentes: “Eu prefiro [trabalhar de forma independente] pelo controle do projeto, saber tudo o que está acontecendo e o que está sendo feito de importante em cada área da produção”.

Marcos Juliano Riffel é veterano nessa indústria e já programou alguns jogos indie. Hoje ele é professor universitário de games e alimenta um pequeno site onde disponibiliza seus trabalhos. Ele faz uma pequena análise sobre o desenvolver de game indie: “Tenho como conceito Indie Dev [desenvolvedor indie] como o cara que faz o jogo independente da grana ou sucesso, porque o estúdio menor pode arriscar mais, daí nascem as pérolas.”

Assim como um trabalho artesanal, muitas vezes os games indie carregam em suas características a personalidade de seus desenvolvedores. O baixo custo na produção faz deles produtos mais acessíveis aos gamers. 

Nos últimos anos, o número de empresas desenvolvedoras subiu 600% no Brasil. Em 2008, a Associação Brasileira de Games (Abragames) contabilizou 43 produtoras em território nacional, enquanto em 2018 já havia cerca de 300 empresas registradas. 

Em 2016, o setor faturou 1,6 bilhão de dólares no país. Mesmo ano em que, segundo o IBGE, o resto do setor de serviços registrava queda de 4,6%. Esses números mostram como a indústria de games é um mercado efervescente, que já movimenta mais dinheiro que a indústria do cinema e da música.

Fator fundamental para a popularidade dos games indies, a chegada dos smartphones possibilitou que desenvolvedores pudessem programar jogos em celulares Android. Victor Pedrosa nunca foi grande fã de videogames, mas durante o Ensino Médio se interessou pelo assunto, então decidiu entrar na Fatec Carapicuíba. 

Formado em Programação, o jovem trabalha atualmente com desenvolvimento mobile na empresa Qmidia e vê com bons olhos a chegada da nova mídia. “Acho que teremos cada vez mais jogos para celular e eles serão cada vez melhores. Prefiro acreditar que o mobile é uma nova plataforma”. Outra vantagem dos jogos mobile é sua facilidade de publicação. “Em cerca de 3 horas você consegue criar a conta, publicar o aplicativo e já deixar disponível para download”, exemplifica. 

Para ilustrar esse cenário de produções independentes, podemos citar jogos como Undertale, CupHead e, o mais recente deles, Celeste.

CUPHEAD

CupHead foi um game lançado por um pequeno estúdio canadense, o Studio MDHR, em 2017. No estilo run and gun e plataforma, o game impressiona por sua beleza, alta dificuldade, trilha sonora e jogabilidade. CupHead traz uma nostalgia dos games antigos e preenche uma lacuna entre os fãs dos jogos de plataforma. Ele vendeu 3 milhões de cópias em dois meses e ganhou os prêmios de Melhor Direção de Arte e Melhor Estreia no Games Awards 2017.

UNDERTALE

Undertale entrou para o ranking da Steam dos games mais vendidos de 2015. A história do jogo utiliza recurso em que o jogador faz escolhas que definem radicalmente o destino dos personagens, além das batalhas que podem ser resolvidas apenas com diálogos, sem a necessidade de confronto. Undertale foi criado por Toby Foz e sua trilha sonora remete ao rock em 8-bits. O game é aclamado até hoje e ganhou um prêmio por votação popular de melhor jogo já da história, organizada pelo site gameFAQs.

CELESTE

Lançado em 2018, o game tem a participação dos brasileiros Amora, Heidy Motta e Pedro Santo. No melhor estilo plataforma retrô, o game foca na narrativa e mostra uma história que empolga o jogador. Com uma arte impecável, Celeste participou entres os indicados de GOTY (Game of the Year), em 2018. No mesmo ano o game vendeu 500 mil cópias segundo o criador do jogo Matt Thorson.

Daniel Camargo também é desenvolvedor de games e começou a programar jogos por hobbie. Conforme foi se especializando, transformou seu passatempo em trabalho.

Formado pelo IBTA e especialista no assunto, Daniel também leciona programação de games. 

Quando comparado como as grandes produções, Daniel aponta os fatores mais importantes para a comunidade gamer. “A maior diferença entre os games indies e os games AAA é a recepção do público. Games AAA são mais avaliados pelo gráfico, visual e duração de campanha, enquanto games indies chamam a atenção pela história, com mecânicas e inovações no gameplay”, comenta.

Segundo Daniel, “os games AAA raramente trazem grandes inovações em mecânica, história ou gameplay, enquanto os games indies são verdadeiras caixinhas de surpresas.”

A participação destes jogos independentes em premiações mundiais e os recordes de vendas alcançados pode ilustrar como o mercado para pequenos estúdios e  desenvolvedores está crescendo e preenchendo lacunas deixadas pelos games AAA. 

Daniel comenta esses “vazios” deixados pelas grandes produções: “Os jogos AAA são criados com bases consideradas seguras para as empresas. Eles seguem padrões que já vem sendo usados a muito tempo pela indústria. São funcionais, mas não trazem inovação. E os jogos indies estão preenchendo justamente esta vontade do público de experimentar coisas novas e diferentes”.

Confira a reportagem do Nexo sobre a industria dos games

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