Crítica | Tick, Tick… Boom! é uma homenagem de Lin-Manuel Miranda e um despertar para os sonhadores de plantão

Para aqueles que trabalham com teatro, o sentimento que Jonathan Larson descreve durante toda a peça Tick, Tick…Boom! é familiar, principalmente para os jovens escritores, atores e para qualquer outra profissão do ramo. A vontade de ser reconhecido, criar um trabalho significativo e, como o próprio escritor diz, “acordar uma geração” são objetivos que descrevem muito bem o que o escritor anseia. Mas essa vontade e necessidade de alcançar um prestígio é muitas vezes contraposta por um senso latente de tempo se esgotando que muitos jovens sentem até hoje. As várias camadas que Jonathan criou em sua peça original são reproduzidas na tela por Lin-Manuel Miranda, que não deixa de adicionar as suas próprias à produção, entregando uma adaptação atual, sensível e identificável.

Isso acontece porque o próprio Lin é um fã do trabalho de Larson, conhecendo Tick, Tick… Boom! quando tinha apenas 17 anos. Mas não foi até seus 21, durante a première da versão póstuma da peça que o escritor teve seu despertar para desenvolver seu próprio musical. 20 anos depois, Miranda se vê dirigindo a adaptação da peça que o encorajou a entrar na indústria. Portanto, esse histórico da relação de Lin com o musical e com Larson é essencial para entender as camadas que o filme proporia para a audiência, começando em apenas um filme musical até a reflexão e relatividade do tempo.

Foto: MACALL POLAY/NETFLIX © 2021
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Essa é a ideia de Tick, Tick… Boom!: é 1990 e Jonathan (interpretado por Andrew Garfield) está apenas a alguns dias de fazer 30 anos de idade – um marco para sua vida, já que o personagem passou sua juventude escrevendo o musical Superbia que, por faltar sua principal música, ainda não viu a luz do dia. Ele se sente um fracasso, já que sua maior comparação é Stephen Sondheim (interpretado por Bradley Whitford), que estreou na Broadway com seus 27 anos. Larson, então, tem apenas uma semana para concluir tal música a tempo de apresentar seu musical para um leque de produtores de Nova Iorque na esperança que algum deles tenha interesse na produção e a faça acontecer.

Assim, o longa começa apresentando uma gravação, que a princípio parece da peça original, mas logo Garfield é visto, fazendo a apresentação teatral da peça, na pele de Larson. Mesmo que limitados pelas músicas originais, tanto Lin, como o roteirista do longa, Steven Levenson, encontram um jeito inteligente de adaptar um musical que é descrito como “um rock em monólogo”. Através da apresentação da peça intercalada pelas cenas sobre a vida do personagem, Levenson encontra brechas para contar a história para além das próprias palavras de Larson, humanizando seu jeito de pensar e intensificando seus sentimentos.

Tal feito é obtido graças a gama de assuntos que a peça original ousa abordar: crise jovem adulta, relativismo do tempo e carreira estagnada ao mesmo tempo que aceita e aponta o que estava ocorrendo na época, a crise de AIDS que envolveu o país. Apesar dos vários assuntos, o longa consegue reunir todos por uma uma única raiz: a relação de todos os personagens com o tempo.

Foto: MACALL POLAY/NETFLIX © 2021
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E tempo, aqui, é a palavra-chave. Portanto, não é atoa que o o título da produção e os constantes tiques de relógio quando Jonathan se vê em altos momentos de ansiedade remetem à isso. Para Jonathan, fazer 30 anos e ainda não ter sua primeira peça na Broadway está diretamente ligado ao fracasso. Sua juventude está acabando, e seu possível sucesso, cada vez mais longe. Esse medo é muito comum entre jovens, denominado até de “a crise dos 30”.

Mas, mesmo legitimando a ansiedade de Larson, que vê sua vida completamente de cabeça para baixo, Miranda joga de forma inteligente com o relativismo do tempo. Larson considera que sua vida está a beira do colapso, do fim, mas como isso poderia ser real se tantos amigos seus estão enfrentando um perigo que realmente os faz encarar o fim da vida? A crise de AIDS nos anos 90 era latente e, até aquele ponto, Larson já havia ido a enterros de amigos próximos que nem chegaram aos 30 anos.

Só que, ao apresentar logo no começo da produção o final trágico do escritor, que falece de um aneurisma na noite da première de seu maior sucesso, Rent (1996), apenas seis anos após os acontecimentos do longa, Levenson, com suas falas, e Miranda, com a suavidade e fluidez em sua direção, conseguem dar mais vida ao personagem e sentido a esse aperto no coração de Larson, que deixa claro sua vontade e perseverança em seguir seus sonhos como se já soubesse que seus amanhãs em algum momento iriam acabar.

Foto: MACALL POLAY/NETFLIX © 2021

E se é criado essa base para o personagem, Andrew Garfield a reproduz com maestria. O ator faz o personagem que a audiência já sabe que não tem um final feliz, passar bem longe de qualquer sentimento de pena por parte daqueles que o assistem. Aliás, Larson é interpretado com a vida mais cheia de energia e sonhos que se é possível interpretar. O carisma que Garfield já é conhecido por ter transparece em seu personagem, que o faz ficar ainda mais fácil de se identificar. O longa não te pede para ter pena ou lamentar seu fim, mas sim apreciar a criatividade e persistência que Jonathan Larson possuía.

Para aqueles que apreciam ou são fãs de musicais vão ter um deleite durante as quase 2 horas de filme, ainda mais se conhecerem o trabalho de Miranda, que não perde a oportunidade de colocar referências, e de homenagear a vida e legado de Larson. No entanto, o contrário também é válido, pois Tick, Tick… Boom! também cativará aqueles que são taxados de “altos sonhadores”. Além disso, talvez até despertará outros artistas a seguir e persistir em seus sonhos, exatamente como Miranda fez e assim mostra.

Tick, Tick… Boom! estreia dia 19 de novembro na Netflix. Clique aqui e confira o trailer.

Crítica

Título: Tick, Tick… Boom!
Direção: Lin-Manuel Miranda
Roteiro: Steven Levenson
Elenco: Andrew Garfield, Vanessa Hudgens, Bradley Whitford, Alexandra Shipp, Judith Light

Nota: 4,5/5

Aliás, o que você espera do longa? Deixe nos comentários. No entanto, não esqueça de nos seguir nas redes sociais.

Gabrielle Yumi
Jornalista e sócia do Quarto Nerd, sou apaixonada por cultura pop e whovian all the way. Busco ativamente influenciar e ampliar a voz de mulheres no meio geek/nerd. Cabelo colorido e muito pop é quem eu sou dentro do meu quarto nerd.