Crítica | Sky Rojo mostra machismo e xenofobia descaradamente

Crítica | Sky Rojo mostra machismo e xenofobia descaradamente

Ontem, 19 de março, chegou ao catálogo da Netflix a série espanhola, Sky Rojo. Em uma tradução livre, Céu Vermelho. Dos mesmos criados de La Casa de Papel (2017-atualidade), Sky Rojo conta a história de Wendy (Lali Espósito), Gina (Yanis Prado) e Coral (Verónica Sánchez), que são três prostitutas que passam a primeira temporada toda fugindo do seu cafetão, Romeo (Asier Etxeandia).

E quando você começa assistir a série, você não entende muita coisa. Os primeiros dois episódios são bastante confusos. As cenas bastante explícitas mostram as mulheres trabalhando em um prostíbulo, e claro, os homens se aproveitando muito bem daquele ambiente. Até porque, a série retrata muito bem o machismo e o que é usar das mulheres para conseguirem o que querem.

E como se não bastasse o Romeo como cafetão, seus capangas Moisés (Miguel Ángel Silvestre), e Christian (Enric Auquer) também fazem parte de toda essa máfia. Porque sim, tudo isso não é nada mais do que uma máfia. Já que, em vários momentos durante a temporada, Moisés viaja atrás das mulheres prometendo condições melhores e claro, não é bem isso o que acontece.

Mas, apesar da confusão nos primeiros episódios, as coisas vão se explicando no decorrer da série. E o telespectador vai entendendo porque as coisas são como são. Os episódios tem em média 25 minutos, o que não cansa a pessoa de assistir, então a maratona acontece relativamente rápido. E também, a curiosidade de entender a história faz com que o telespectador assista a temporada toda de uma vez. Confira o trailer abaixo:

Trailer oficial de Sky Rojo.

Mas, como nem tudo são flores, a história tem sim os seus problemas. E retrata uns assuntos delicados demais de forma muito grosseira. O que pode enjoar o telespectador, e nós vamos abordar tudo para vocês.

Machismo

A história se passa em um ambiente onde Wendy, Gina e Coral fogem de Romeo em busca de uma condição melhor de vida. E por mais que o prostíbulo garanta às meninas dinheiro, luxo e comida, as condições claramente não são as prometidas. As três e as demais prostitutas vivem todas juntas no mesmo local de trabalho, todas visivelmente abaladas pelas frustrações e promessas não cumpridas.

Mas, o pior de tudo é que a vida em que elas se encontram é um ciclo vicioso. Elas trabalham para se sustentar e mandar dinheiro para a família, algumas escondendo a sua real situação. E por mais que elas estejam em busca de uma condição melhor de vida, não conseguem sair da prostituição porque estão sempre em dívida com Romeo. Ou seja, tudo não passa da insana necessidade de Romeo ter dinheiro e luxo, para ostentar uma vida que faz as mulheres se venderem para ele ter.

E o personagem de Asier deixa muito claro, em praticamente todos os momentos em que ele aparece na série, que ele não se importa com as mulheres e suas necessidades biológicas. Não se importa com a dor, o sofrimento ou qualquer que seja os sonhos e buscas por melhorias. Tudo o que importa para ele é o dinheiro. E a insana vontade de ter o maior serviço de prostituição da Europa. Inclusive as suas falas demonstram isso, como em um dos episódios, quando conversa com os seus capangas falando que tudo o que aconteceu de importante no mundo até hoje foi porque os homens pensaram com o seu pênis. Claramente ignorando todo o esforço feminino que existiu até hoje.

Ou seja, a incansável luta de anos das mulheres para reconhecimento e igualdade no mundo é completamente esquecida pelos escritores da série. E apesar de ser só uma história, a forma com que ela é contada não agrada nem um pouco a comunidade feminina. Porque, mais uma vez, parece que de nada adianta mostrar que as mulheres não são objetos sexuais. Algo que já é bastante óbvio a muito tempo, mas Sky Rojo ignora completamente.

Xenofobia

Não podemos esquecer o lado xenofóbico da série, que também é um assunto delicado tratado de uma forma bastante grosseira. A história se passa na Espanha, e todos os personagens fazem com que o país seja o melhor do mundo. Mas, a abordagem que os escritores trouxeram sobre a América Latina, mais específico do Brasil e da Colômbia, soa um tanto quanto preconceituosa.

A história gira em torno das prostitutas, isso fica bastante claro desde o começo. Mas, quando Moisés sai para procurar mulheres que satisfaçam as necessidades do seu patrão, o capanga sempre ressalta que suas procuras são nas favelas do Rio de Janeiro e nas comunidades de Medellín, na Colômbia. O que, para o telespectador, em um primeiro momento não causa incômodos.

Mas, já no final da temporada, em uma cena aonde Moisés conversa com Coral sobre o seu trabalho, a sua intonação e suas falas são um pouco infelizes. Moisés diz para Coral que jamais iria procurar por garotas na Suíça, porque se oferecesse trabalho para elas como garçonete (o que é a promessa inicial), nenhuma delas aceitaria por serem ricas. Mas, ao chegar no Brasil e na Colombia, é fácil conquistar as garotas assim pois elas são pobres. E é justamente nesse momento que o incômodo nasce.

Claro, sabemos que a situação no Brasil, economicamente falando, não é a das melhores. Apesar de sermos um país enorme, muita gente se encontra em uma situação econômica mais delicada. Mas para nós, brasileiros, sabemos que muitas pessoas chegam a ter dois ou até três empregos para conseguir se sustentar. Não podemos ignorar e fingir que não existe, mas não é como se a prostituição fosse a primeira solução para uma melhor condição de vida. Ainda mais sabendo de todos os riscos que uma mulher corre nessa profissão.

O que faltou da parte dos escritores da série é estudar um pouco mais os países do qual eles retratam na série. Inclusive porque, mais uma vez, a mulher brasileira foi exposta ao mundo como um símbolo sexual. O que não é bem assim, não é mesmo?

A luta das mulheres

Apesar da história mostrar a luta de Wendy, Gina e Coral por uma vida melhor, a abordagem de alguns assuntos não foram feitos da forma mais delicada possível. E isso faz com que a série se torne mais uma vez preconceituosa, contra a mulher e contra a história do Brasil. E apesar também do roteiro da história ficar melhor a cada episódio, a série termina com muitos detalhes inacabados. Mas, para a alegria do telespectador, a segunda temporada de Sky Rojo já foi confirmada. Ou seja, todas as perguntas que ficam sem respostas serão compreendidas no futuro.

Mas, por outro lado, o desrespeito constante com as mulheres e o fato de que a mudança de profissão delas não é aceita pela sociedade incomoda. E muito. Até porque, não existe mais espaço para tamanho desrespeito com as mulheres e a luta do feminismo. Que, por mais que seja ‘só uma história’, irrita bastante quem assiste. É mais uma série que nos faz querer chorar, por trazer uma sensação de que não vale a pena anos de luta se mais uma vez, as mulheres vão ser retratadas como objetos sexuais e de favores para os homens.

Talvez o mais revoltante de tudo é ver o descaso que foi abordado com o sexo feminino na série. E, apesar de as mulheres se juntarem para tentar em conjunto mudar de vida, a necessidade e o desespero das demais colegas de trabalho façam com que elas não enxerguem a importância que é sair do ambiente que estão. E a coragem trazida em Wendy, Gina e Coral é com certeza a melhor parte da história.

Isso porque, as três juntas conseguem mostrar que as mulheres quando unidas, conseguem ir longe. Não importa o que acontecer e custe o que custar. Mostrando que a sororidade feminina é de tamanha importância. Porque, por mais que a luta seja longa, alguns resultados, nós enquanto sociedade já atingimos. E a tendência é chegar ainda mais longe.

Considerações Finais

Não tem como a história se encerrar nessa primeira temporada, sendo obviamente necessária uma segunda. Mas, o que esperamos é um roteiro menos preconceituoso, menos xenofóbico, e todas as abordagens delicadas tratadas da forma que precisam ser. Com bastante atenção e cuidado com as palavras.

Até porque os acontecimentos são muito importantes para explicar como cada uma delas chegou ao prostíbulo do Romeo. Mas são tão importantes para explicar porque as três conseguem fugir. E qual é o plano delas, juntas, para mudar de vida mais uma vez. Mas, agora, para deixar o passado de prostituição para trás e conseguirem viver a sua vida da melhor forma possível.

Sky Rojo é uma série para quem gosta de bastante ação e confusão. Não só isso, claro. Já que tem bastante cenas com nudez explícita e apologia às drogas. Mas, para quem quer distância desses assuntos (alguns que podem ser gatilhos), essa série definitivamente é uma que você deve ignorar no seu catálogo.

Ainda não temos mais informações sobre a segunda temporada, além dela ter sido confirmada. Mas é claro, vamos ficar de olho em todas as atualização e trazer os detalhes para vocês! Então já sabem, fiquem de oho por aqui.

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Crítica | Sky Rojo mostra machismo e xenofobia descaradamente

Título: Sky Rojo
Direção:  Jesús Colmenar; Óscar Pedraza; David Victori; Albert Pintó, Javier Quintas, Eduarto Chapero- Jackson
Roteiro: Álex Poina, Ether Martinex Lobato, David Barrocal, David Oliva Javier Gómez Santander, Juan Salvador López
Nota: 2/5

Mas e você, já assitiu a primeira temporada de Sky Rojo? Nos conte tudo nos comentários!

Camila Scovoli
Redatora do QN. Apaixonada pela cultura pop. Não vivo sem música, clipes e documentários sobre música. Amo conversar sobre as teorias dessa indústria. Alexa, play 5 Seconds of Summer.