Crítica | Ratched é um show visual que não deveria ter existido

ATENÇÃO! A crítica a seguir contém spoilers da primeira temporada de Ratched

Para os que já são familiarizados com “Um Estranho no Ninho”, livro de Ken Kesey e longa de Miloš Forman, a enfermeira Mildred Ratched é uma profissional do mais alto escalão da frieza e crueldade. A personagem utiliza de métodos abomináveis para controlar seus pacientes e humilhá-los, sendo mostrada desde o início como a antagonista da história. Assim, Evan Romansky decide contar como ela se tornou essa sádica mulher e, produzido por Ryan Murphy, a série Ratched nasceu. No entanto, essa premissa seria uma ótima história de origem se de fato fosse uma.

Em Ratched, Mildred Ratched (Sarah Paulson) chega para trabalhar no Lucia State Hospital com uma missão: ela é irmã do assassino Edmund Tolleson (Finn Wittrock), que está lá por executar um massacre de 3 padres. Como enfermeira do hospital, ela faz de tudo para protegê-lo enquanto tenta libertá-lo.

Porém, a série fracassa com muito pesar. Em uma promessa de história de origem, a audiência recebe, na verdade, uma Mildred completamente sadista e manipuladora desde os primeiros minutos.

A narrativa, assim como quase todos os personagens, é assassinada

Praticamente nada funciona em Ratched. Os plots românticos. A dinâmica entre os atores. O desespero do roteiro em ser chocante. As mortes completamente do nada. Praticamente nada funciona. Mas isso não chega perto da cena mais mal escrita da temporada – que no contexto serviria de história de origem.

Depois da metade do episódio seis – de uma série com oito episódios – Mildred finalmente conta sobre sua infância horrível para a mulher que ela ama e que agora, só agora, diz que não consegue mais mentir. Então, com Sarah Paulson contando diretamente para a câmera a história macabra que passeia entre abuso, violência e tudo que pode acontecer no sistema de adoção, finalmente entendemos o porquê da personagem ser daquele jeito. E essa história até funcionaria, comovente que foi, se não tivesse existido um show de marionetes que já contou essa exata história minutos antes.

E o problema, escancarado com essa cena, não é a mera repetição de fatos, é a falta de uma história de origem que faça jus à uma personagem que, honestamente, não precisava de uma.

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Além disso, a falta de continuidade nos eventos da série causa quebras de expectativas que ultrapassam o choque intencional e caem no questionável. Isso acontece porque Evan e Murphy optam por desviar da história central para propositalmente tentar causar choque com mortes completamente desnecessárias para a história. E tudo enfatizado por uma trilha, que no começo da série se apresenta como grandiosa e ritmada, mas que ao longo dos episódios se torna outra ferramenta de indução de choque, mas que a essa altura, só incomoda.

A edição tenta salvar o que direção e roteiro juntos não conseguem

No entanto, nem de absurdos e história mal contatas vive Ratched. Apesar dos seus nítidos problemas, a série se destaca em seus cortes entre cenas que dialogam com a tensão presente. Brincando com o movimento das câmeras e múltiplos eventos acontecendo ao mesmo tempo, a edição é um dos poucos motivos para terminar a série e não simplesmente parar após dois episódios.

Assim, a edição utiliza de métodos de quadrinhos para dividir a tela nos três ou mais personagens envolvidos naquela cena em específico. E isso acontece durante a temporada toda. Aqui, aliás, a trilha volta a fazer sentido, já que acompanha os cortes e divisões de telas a modo de induzir a audiência a tensão proposta no roteiro (o que, em Ratched, é raro dar certo).

Apesar dos enormes problemas com o roteiro e sua execução, Ratched é um show de cores, visuais e acontecimentos que, mesmo que no final não tenham uma lógica narrativa, faz a audiência que veio somente por Ryan Murphy e Sarah Paulson se sentir nostálgica com os tempos de American Horror Story. Mas se você se encaixa na parte da audiência que esperava uma história de origem digna da personagem, irá se decepcionar com a história desnecessária que foi criada para uma antagonista icônica.

A primeira temporada de Ratched está disponível na Netflix.

Nome: Ratched
Criadores: Ryan Murphy e Evan Romansky
Elenco: Sarah Paulson, Finn Wittrock, Cynthia Nixon, Jon Jon Briones, Charlie Carver, Judy Davis, Sharon Stone

Nota: 2/5

Gabrielle Yumi
Jornalista e sócia do Quarto Nerd, sou apaixonada por cultura pop e whovian all the way. Busco ativamente influenciar e ampliar a voz de mulheres no meio geek/nerd. Cabelo colorido e muito pop é quem eu sou dentro do meu quarto nerd.