Você já ouviu falar em BookTok? Se não, este artigo vai te contextualizar sobre essa ferramenta tão importante para a efervescência literária das novas gerações.
Desde a popularização da internet, as editoras e os autores vêm surfando na onda das novas tecnologias. Esse fenômeno se iniciou na era dos blogs literários, e acabou ficando nichado em um público jovem adulto. O blogueiro postava sua resenha, e só sabia se estava agradando seus leitores a partir dos comentários que possivelmente recebia de feedback.
Logo em seguida, veio o YouTube – que consolidou uma comunidade literária de vloggers logo conhecida como o BookTube. O sucesso dos booktubers residia, principalmente, no fato de que esses vídeos eram criados por pessoas de idades semelhantes às dos jovens que navegavam por esse site.
Mesmo assim, a necessidade das editoras de promover seu catálogo no setor juvenil nas redes nunca foi melhor contemplada do que pelo Instagram, que não apenas é alimentado por vídeos, mas sim por um conjunto de ferramentas de mídias visuais. Os bookgrammers, como ficaram chamados os usuários com perfis literários, entregam uma comunicação ainda mais perene e com um arco de alcance bem maior, ainda que acompanhando a efemeridade da plataforma.
Sendo assim, a reação e a avaliação do conteúdo postado passou a valer muito mais do que a avaliação tradicional – escrita –, já que é esse engajamento é quem ativa os algoritmos e auxilia a viralizar na rede. No entanto, essa divulgação orgânica feita pela grande comunidade de internautas amantes da literatura não parou no Bookgram…
TikTok e literatura: um fenômeno pandêmico?
Com o advento da pandemia da Covid-19, o TikTok, que já vinha crescendo, ganhou ainda mais espaço e relevância. Isso porque, com o isolamento social, as pessoas passaram a ter mais tempo em casa, ou seja, mais tempo para gastar nas redes sociais e em outras mídias. Nesse sentido, o aplicativo ganhou um público inesperado – antes, com seus usuários sendo majoritariamente da geração Z, hoje, muitos millennials acabaram se rendendo à plataforma.
Com as pessoas buscando entretenimento fora das telas – entre eles, satisfação e alento por meio da leitura –, o fenômeno da hashtag #BookTok foi favorecida. Em junho de 2021, o aplicativo foi o mais baixado em todo o mundo nas lojas da Google e Apple. Em março de 2021, o nicho possuía 5.8 bilhões de visualizações; em junho, 9.6 bilhões. Já as pesquisas de julho mostram que, até o dia 8, se somavam 13 bilhões.
Mas afinal, o que é o BookTok?
Nada mais do que uma comunidade de usuários do TikTok que postam vídeo com resenhas, recomendações, análises, teorias e fanarts sobre livros. Com o seu crescimento, o impacto no mercado editorial foi rapidamente notado: obras e autores foram impulsionados e levados ao topo da lista de bestsellers, mesmo anos depois de sua publicação original. Um fato curioso é que, a grande maioria dos perfis que produzem esse tipo de conteúdo, são de jovens mulheres.
A reinvenção das editoras e livrarias frente ao crescimento do BookTok
Algumas livrarias, como a Barnes & Noble, aproveitaram o acontecimento e criaram seleções especiais com os livros em alta na plataforma, atingindo um outro nicho de clientes. Segundo o diretor de livros da empresa, Shannon DeVito, eles identificam tais tendências como boas oportunidades e sabem que potenciais clientes podem procurar as lojas influenciados por publicações do TikTok.
Seguindo a mesma lógica de vantagem comercial, livrarias e editoras têm feito publicidade através de criadores de conteúdo que integram a comunidade de BookTok para divulgarem suas obras. E alguns tiktokers acabam trabalhando em parceria com editoras e autores independentes, divulgando seus títulos por meio de permuta ou pagamentos em dinheiro.
Existem também as contas das próprias editoras, como a Penguin, que criou um perfil no TikTok chamado Penguin Teens, e hoje conta com mais de 240.000 seguidores.
Neste contexto, os leitores são ainda mais cruciais para o sucesso ou não de uma publicação, visto que suas reações, comentários e engajamento na rede podem, rapidamente, ter impacto direto nas vendas.
Confira também:
Prova disso foram nomes como E. Lockhart, Sarah J. Maas, a autora de Harry Potter, e Rick Riordan, que entraram de volta na lista mais vendidos mesmo anos após as publicações de suas grandes obras. Além de tudo, o aplicativo facilita a entrada de um público mais jovem no mundo da literatura e possibilita o resgate de títulos mais antigos para novos leitores, fomentando uma movimentação no segmento editorial.
Segundo Kat McKenna, consultora de marcas especialista em livros infanto-juvenis, o BookTok vem fazendo um marketing de trazer as páginas à vida além das palavras, de forma que os editores tentavam fazer há tempos. “Esses trailers curtos estão tornando os livros audiovisuais […] o modo que os usuários do TikTok estão criando imagens através do que leem é tão simples e tão inteligente”.
Casos virais do BookTok
(Imagem: Divulgação)
Um exemplo desse cenário promissor é Chloe Gong, estudante na Universidade da Pensilvânia, nos EUA. Em abril de 2020, ela começou a publicar vídeos com análises e discussões sobre os livros que estava lendo, já prevendo ganhar espaço na comunidade de BookTokers para, futuramente, vender sua própria publicação, que estava em processo editorial. Em novembro do mesmo ano, quando lançou a obra These Violent Delights, seu perfil bem ranqueado pelo algoritmo a ajudou a atingir a lista de bestsellers do New York Times.
De acordo com a autora, o diferencial do TikTok em relação ao Twitter e Instagram é que o algoritmo funciona de maneira diferente. A maioria dos booktokers não têm muitos seguidores, mas seus vídeos viralizam em likes e visualizações. Seu conteúdo, por exemplo, atinge desde pessoas interessadas em livros no geral, em ficções young adult, até aquelas que se interessam por obras com um enredo deste tipo. Assim, é possível ir além do grupo seleto de seguidores de seus perfis nas redes sociais.
(Imagem: Divulgação)
Outro caso de sucesso foi o livro They Both Die at the End, de Adam Silvera, lançado em 2017. Reapresentado aos olhos do público no segundo semestre de 2020, a obra foi parar no topo da lista mensal do New York Times de brochuras infanto-juvenis mais vendidas em abril do ano seguinte. No total, Silvera vendeu cerca de 400.000 cópias somente no Reino Unido, sendo mais da metade somente a partir de 2021, após um desafio que viralizou no aplicativo, no qual o usuário postava sua reação sobre o final da história. Hoje, comenta-se sobre uma adaptação da Netflix em formato de série.
(Imagem: Divulgação)
E, por fim, o livro The Song of Achilles, de Madeline Miller, lançado em 2012. Ganhou o prêmio Orange Prize for Fiction e vendeu bem quando foi publicado, mas nada se compara com o sucesso obtido após ser listado por um usuário do aplicativo em uma lista dos “livros que te farão soluçar de tanto chorar” em 8 de agosto de 2020. Já no dia seguinte a Ecco Press, editora do livro, viu o número de vendas crescer exponencialmente e de acordo com a NPD BookScan, empresa que rastreia os exemplares impressos de livros vendidos na maioria das revendedoras estadunidense, entre o reaquecimento das vendas e março de 2021, a obra tinha vendido 10.000 cópias por semana.
O cenário brasileiro
No Brasil, a comunidade de booktokers ainda é emergente, e aproveita de muitas trends criadas por booktokers do exterior, tais quais os desafios de reações a trechos determinados de livros, as simulações sensoriais de ir a livrarias, aos unboxings etc. Todavia, existem alguns grandes perfis que já sobressaíram, conquistando espaço e criando conteúdos únicos e bastante identitários, como é o caso do Jota Vê, que fala sobre polêmicas literárias, a Nath Bartolo, que faz diversas resenhas engraçadas, ou a Livraneios, que divulga autores independentes nacionais.
Há, ainda, booktokers brasileiros que optam por criar tags de opinião pessoal, como é o caso de Jéssica Martins – que tem vídeos famosos com títulos como “Personagens que conquistaram meu coração” e “Livros populares que eu não gostei” – e Ivana M. Amaral, que opta por fazer sequências de indicações: “livros para relaxar” ou “livros para viajar sem sair de casa”.
(Imagem: Instagram / Reprodução)
Dentre os booktokers brasileiros que embarcam nessa onda de autodivulgação em meio a criação de conteúdos virais, pode-se destacar Pedro Rhuas, que venceu o prêmio Clipop em 2020 com seu livro de estreia, o livro de comédia romântica gay Enquanto eu não te encontro, e Nadson Oliveira, que além de encenar situações corriqueiras engraçadas do mundo literário no TikTok, também é autor do Wattpad.
Representatividade no BookTok BR
De forma geral, o seu nicho literário do TikTok é uma crescente a ser acompanhada com atenção. O algoritmo, o engajamento nos perfis, a agilidade com que se é possível navegar pela plataforma e as demais variáveis que contribuem para uma user experience cativante podem ser aliados importantes para o mercado editorial.
Cientes da preponderância dos gêneros mais populares – geralmente, romances, fantasia e young adult, com protagonistas heterossexuais, cisgêneros e brancos –, os creators têm cada vez mais se movimentado organicamente para expandir a representatividade dos livros que divulgam, tanto em termos de etnia, quanto em relação às diferentes orientações sexuais e identidades de gênero.
Confira também:
O Brasil, especificamente, lidera uma abordagem diferenciada no que tange os temas e subtemas das obras divulgadas pelo BookTok – talvez por sermos um país de multiculturalidade mais acentuada, que sempre pauta questões de diversidade em seus trend topics. Resta esperar para ver onde isso tudo vai levar a nossa produção literária nacional.
E você? O algoritmo já chegou a te entregar algum conteúdo do BookTok? Qual é o seu tipo de trends preferido? Deixe sua opinião nos comentários!
Encontrou algum erro na matéria? Avise-nos clicando aqui.
(Artigo escrito em coautoria com Daniela Orlandi e Igor Souza.)