Jogos Vorazes foi um fenômeno, tanto literário quanto cinematográfico, e um dos principais elementos das histórias de Suzanne Collins é a relação dos personagens com a música. Seja a inesquecível A Árvore-Forca ou todas as canções presentes em A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes, cada uma delas tem uma função dentro dos livros e dos filmes. Seja como um meio de contar uma história ou como símbolo de algo maior, a música é uma avalanche dentro do mundo de Panem.
Mas afinal, as músicas, cantigas e poemas são tão relevantes assim para o mundo de Jogos Vorazes?
As músicas em Jogos Vorazes são mais do que apenas canções
Dentro da saga Jogos Vorazes, vemos um mundo que se rendeu completamente à barbárie. Após um aparente apocalipse, a América do Norte ressurgiu das cinzas como um novo país: Panem.
Porém, a desigualdade entre as classes sociais tornou-se ainda maior e mais arrasadora, sustentada por um frágil status quo entre a Capital e os Distritos. Quando somos apresentados a esse mundo, percebemos que a normalização da violência é tão intensa que a esperança é a última coisa que qualquer pessoa pode se lembrar.
Ao longo da história, porém, vemos que toda essa opressão, mantida por mais de 75 anos, dá origem a uma revolução que muda todo o continente. E, em meio ao caos da guerra, a música se torna algo além de um simples ato de contar histórias por meio de rimas e acordes. Ela se transforma em um símbolo de resistência.
Essa relação entre música e revolução sempre foi capaz de mudar a visão da sociedade como um todo. Trazendo para o mundo real, a música sempre impactou a sociedade e reflete a juventude de sua época. O Jazz, por exemplo, foi um estilo musical majoritariamente ligado à Comunidade Negra dos Estados Unidos. O Rock trouxe vertentes como o Punk, com suas letras antibelicistas, e o Rap, em suas origens, tornou-se um grito de resistência das periferias. A música sempre teve um papel que vai além de algo que simplesmente se escuta – ela é uma forma de expressão artística.
Confira também:
- Capitão América: Como Sam Wilson Redefine o Heroísmo
- Arcane II – review, pautas pertinentes e continuidade
E como expressão artística, a música transmite uma mensagem – e é exatamente isso que vemos acontecer em Jogos Vorazes.
Seja em A Árvore-Forca , onde temos uma música original da história que se torna um dos símbolos da revolução, incluindo uma das cenas mais impactantes dos filmes, ou emO Velho Antes , que é cantada no momento da vitória de Lucy Gray nos jogos e também funciona como uma ameaça velada à Capital, todas essas músicas são cuidadosamente pensadas e possuem uma mensagem poderosa dentro da narrativa.
A Árvore-Forca (cuja origem é explorada em A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes) começa como a história de um amor impossível, mas acaba se transformando em um hino de levante popular contra os opressores.
Já dentro da história de A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes, O Velho Antes funciona inicialmente como uma forma de reforçar a imagem de Lucy Gray como uma cantora tão talentosa que conquista até as mais vorazes serpentes. No entanto, além disso, a letra da música carrega um significado mais profundo: ela transmite a ideia de que, independentemente do que a Capital faça, Lucy Gray sempre encontrará uma maneira de superar suas opressões.
O Impacto da música na nossa sociedade
Mas, afinal, por que estou falando tanto sobre as músicas de Jogos Vorazes e como elas são mais do que apenas canções? Porque, assim como a vida imita a arte, também temos músicas que, em suas letras, expressam a revolta popular de uma sociedade.
No entanto, vou me afastar um pouco da temática norte-americana em que Jogos Vorazes está inserido e falar sobre a nossa realidade como brasileiros. Há não muitos anos, o Brasil passou pelo período da Ditadura Militar, e, mesmo que eu, assim como várias outras pessoas mais jovens, não tenha vivido nessa época, não podemos ignorar o impacto que esse período ainda tem nos dias de hoje.
Em tempos em que políticos, ex-presidentes e até mesmo jovens como eu idolatram esse período sombrio, é fundamental lembrar que também tivemos nossos revolucionários musicais. Alguns ainda estão vivos, como Milton Nascimento, Chico Buarque e Caetano Veloso, enquanto outros, como Raul Seixas e Rita Lee, já nos deixaram. No entanto, o impacto de suas músicas continua reverberando até hoje.
Afinal, mesmo que você não goste das músicas deles, por qualquer motivo que seja, é impossível ignorar sua relevância. Cálice, de Chico Buarque e Milton Nascimento, por exemplo, é uma crítica velada ao governo brasileiro da década de 1970, período de maior repressão durante a ditadura.
Confira também:
- Flow é bonito, ousado e emotivo
- Crítica | ‘Sem Chão’ mostra incertezas de palestinos inocentes em meio a guerra
Outro grande exemplo de música que aborda a resistência de forma velada é Mosca na Sopa, de Raul Seixas.
É claro que há muitos outros exemplos de músicos que, por meio de suas canções, buscaram expressar o sentimento de revolta diante da situação do país. Um exemplo mais recente é a banda Legião Urbana, que surgiu após o fim da Ditadura Militar, mas ainda abordava em algumas de suas músicas a insatisfação com um Brasil recém-saído desse período e que continuava enfrentando diversos problemas, além da repressão militar.
A música sempre foi e sempre será um meio de revolta
No final das contas, o que quero dizer com este texto é que a música sempre desempenhou um papel fundamental como ferramenta de mudança cultural. Seja intencional ou não – e eu acredito que quase sempre seja intencional –, a música expressa os sentimentos de uma sociedade em determinado período.
Nosso papel, muitas vezes como ouvintes, é compreender que toda música tem sua importância dentro desse processo de transformação. É claro que sempre haverá músicos que preferem não “cutucar” esse vespeiro e escolhem direcionar sua arte para outros temas – e isso também é válido.
Porque, no fim das contas, a música, em sua essência mais pura, é algo que usamos para aliviar a dureza da realidade. Seja você um carvoeiro do Distrito 12 em Panem ou apenas um trabalhador CLT no Brasil, sempre buscamos na música uma válvula de escape para um mundo que, muitas vezes, se mostra cruel e opressor.
Mas e você, acha que a relação entre as músicas de Jogos Vorazes e o mundo real é válida? Conte para a gente nos comentários.